Preferir a verdade


Lágrimas tristes desciam-lhe pela face, ele não estava pronto para a notícia. Já era madrugada e ele ainda estava com os amigos a conversar na varanda da casa nova. No meio do bom papo, das cervejas, do cigarro e do carteado, um sobrenome conhecido, dito em meio a fumaça, chamara-lhe a atenção. E questionando-lhes sobre o assunto – que talvez fosse melhor achar que era só um sobrenome comum – descobrira: amanhã seria seu aniversário e, daquela roda de amigos, ele era o único que não havia sido convidado para a festa.
Ele sabia da realidade dos fatos. Sabia que tinha se apaixonado e que não estava sendo correspondido. Sabia que ela ainda mantinha mágoas de seu relacionamento anterior. Mal resolvido por sinal. A única coisa que ele não sabia era que tinha se enganado tanto a respeito de seu caráter. Tinha visto em seu sorriso uma verdade incondicional, que a firmeza de suas palavras confirmava. Jamais ousou pensar que era mais uma farsa do novo século; mas uma das pessoas que te sorriem porque você pode servir para elas em algum momento, com já o foi. Ele sabia que não tinham um relacionamento, mas ele sempre cogitou a possibilidade de tornar viável tal hipótese, e nunca foi interrompido no processo desse pensamento.
O pior para ele foi descobrir-se em mais uma fantasia doída, de sua mente almejando a solidão de ser dois, encontrando-se sozinho numa roda de pessoas. Tentativas de explicação não adiantariam e ele preferiu ficar sozinho. Saiu em direção ao Arpoador e pôs-se a ouvir o barulho da marola em seus muitos vai e vens. As horas passaram e sua expressão facial de indignação - em não acreditar no acontecido - parecia imutável. Atônito nem pode perceber o clarear do dia.
Já era dia 28 de agosto de 2009, dia em que, seu amor – platônico, porém amor -, completaria 27 anos.
O texto estava quase que decorado: “Bom dia, amor. Estou ligando para te desejar feliz aniversário. Não quero que fique triste, pois não vai ter festa essa ano. Az vezes nós temos mesmo que fazer coisas diferentes, provar outros gostos. Só quero que saiba que ainda aguardo a oportunidade de te amar, respeito seu tempo, sua vida, você. Um lindo dia. Sei que hoje vai ser meio apertado, então te vejo amanhã.”
E os minutos seguintes trariam ao rapaz, novos sentimentos, emoções, gostos, sons e temperatura. O sol já mostrava sua força, num de seus poucos momentos de visibilidade no céu, no mês de férias que já estava por findar. Aos poucos, o calor do sol pareceu ir desgelando o iceberg. Os movimentos de seu rosto pareciam ter voltado e a embriaguês havia passado. Lá estava ele de pé, ainda moribundo.
Sempre é difícil mexer na “Caixa de Pandora” das emoções. Como humanos, ora benévolos ora maléficos são nossos sentimentos e saber o que fazer num momento de decepção é quase impossível. Uns tendem à vingança outros ao cárcere de manterem-se acorrentados a ilusão, ao preferir a liberdade encolhida da solidão. E assim cada um vai levando a vida.
O rapaz aparentemente tinha “perdido um braço”.
Diz-se que uma “mentirinha” pode não fazer mal algum, principalmente se ela faz alguém se sentir bem. A opinião do rapaz não era de concordância com isso. Ao tê-lo feito acreditar na possibilidade de um laço, talvez, levando-o a crença do “Mito do amor perfeito” – o de contos de fadas, idealizado, onde tudo é possível -, aquela menina-mulher acabou devolvendo ao rapaz uma esperança, antes nele de chama já apagada. Antes dela, ele já não mais ouvia as canções de amor e nunca havia se emocionado ao ver um musical da Broadway. O perfume das rosas era comum e o céu era só azul.
Existem pessoas que povoam a vida de outras ao ponto de fazê-las diferentes. Devolvendo-lhes sonhos, fazendo abrir os olhos para o que há em volta o tempo todo e que passa imperceptível na correria do dia a dia. Ao pé que existem pessoas que fazem a diferença, existe outras que as forjam. Gente capaz de passar a imagem do que não é, em busca de algo que não se pode presumir o que se seja.
No caminho de fazer o que é certo, ou do que se julga ser; alguns tomam atitudes de caráter duvidoso, que não podem ser julgados, mas que poderiam ser evitados e tratados com verdade. Isso independe do sentimentalismo emocional apelativo e depende da sinceridade de ser quem se é. É melhor não iludir com uma possibilidade irreal do que fazê-lo só para agradar e em algum momento se ver puxando o tapete depois. A verdade impede a queda, porque não estende o tapete vermelho como passarela. Ela não faz o sorriso perder o brilho, ela devolve o brilho aos olhos.
Não mesmo, ele não deve ligar para desejar a ela os parabéns pelo dia de hoje.
Fica a beleza da válida citação poética:
“Ser capitão desse mundo; poder rodar sem fronteiras.
Viver um ano em segundos; não achar sonhos besteiras.
Encantar-se com um livro que fale sobre a vaidade.
Quando mentir for preciso, poder falar a verdade.”

Raffael Silva.
7 Responses
  1. Denis Says:

    Mais uma vez seus textos falam de um momento q eu to vivendo...
    Preferir a verdade, ou engolir a verdade, nem sempre é um caminho fácil, é um caminho doloroso...
    Seguir a razão na maioria das vezes é o melhor caminho!
    Parabéns mais uma vez pela riqueza das suas palavras!


  2. Letícia Says:
    Este comentário foi removido pelo autor.

  3. Letícia Says:

    As verdades... essas verdades que chega a doer como um corte... Este que lentamente vai sangrando, sangrando, mas que é necessario sangrar, sofrer e deixar que o proprio tempo venha sicatrizar...
    Eu sempre prefiro a verdade.... Mesmo sabendo que tenho que me permirtir sangrar...

    Vc tá um blogueiro nato!

    Amei a casa com a decoração nova... "D

    Amo, sim.... sempre, perto ou longe eu amo!


  4. Este comentário foi removido pelo autor.

  5. Belíssimos textos que fazem a gente refletir sobre vida, existência e convivência. Parabéns pelo belo trabalho.


  6. Nathy Crazy Says:

    Caraca Raffa!!!!!!

    Seu blog ta muito lindo!!!

    Adorei seu post!!!
    Perfect!!

    Bjinhussssss no coração!!!


  7. Anônimo Says:

    foi mal!